Ailton Krenak, ativista indígena, se torna o primeiro indígena imortal da Academia Brasileira de Letras (ABL)

Em entrevista à Agência Brasil e Rádio Nacional, Krenak afirmou que a academia é voltada para a língua portuguesa, e admitir alguém como ele implica em lidar com mais de 200 línguas diferentes. Segundo ele, essa abertura para a multiplicidade de diálogos exigiria traduzir os textos para diversas línguas nativas.
O escritor também ressaltou o fato de que, historicamente, a ABL nunca se abriu para a diversidade das culturas dos povos originários, o que torna sua admissão ainda mais significativa. A surpresa foi comprovada pelo fato de Krenak não ter acompanhado a votação na sede da ABL, pois estava em um táxi quando recebeu a ligação do presidente da academia, Merval Pereira, com a notícia de sua eleição.
Natural de Itabirinha, na região do Vale do Rio Doce, Krenak avalia que a eleição para a ABL rompe uma tradição na instituição, que vigia o bom desenvolvimento da língua portuguesa. Ele lembrou que o Brasil é um país colonizado e, portanto, engloba várias etnias.
Além de escritor, Krenak também é ativista socioambiental e pelos direitos dos povos indígenas. Sua trajetória inclui um discurso proferido na Assembleia Constituinte, em 1987, em que criticou a postura anti-indígena nas discussões parlamentares. Na ocasião, ele pintou o rosto de preto em protesto. Desde então, tem sido uma voz ativa na defesa dos direitos indígenas à cultura e à terra.
A eleição de Krenak para a ABL se deu no dia em que a Constituição completou 35 anos. Ele considera a Constituição Cidadã fundamental para os povos originários e destaca o papel do Supremo Tribunal Federal (STF) na garantia dos direitos assegurados pela lei.
O novo imortal ressalta que não pretende deixar apenas uma mensagem, mas sim um exemplo para as gerações futuras. Ele destaca a importância de seu exemplo para jovens indígenas, crianças e seus netos, incentivando-os a escolherem o que querem fazer.
A trajetória de Krenak tem inspirado outros artistas indígenas, como a ativista e artista visual Daiara Tukano. Para ela, o acolhimento de Krenak pela ABL vai além da chegada do primeiro indígena a um grupo historicamente dominado por homens brancos. Ela destaca a força de sua produção literária, que carrega a oralidade e aborda questões como a não venda do amanhã e a ancestralidade.
Daiara defende a eleição de mais representantes de minorias para a ABL, como pensadores quilombolas e mulheres negras, para que a população brasileira possa se reconhecer na instituição.
A eleição desta semana na ABL contou com dois candidatos representantes de minorias. Além de Krenak, o também indígena Daniel Munduruku concorreu, ficando em terceiro lugar. A historiadora Mary Del Priore obteve a segunda maior votação.
A posse de Ailton Krenak na ABL ainda não está marcada, mas deverá ocorrer em 2024, segundo informações da própria instituição. Ele ocupará a cadeira número 5, que era anteriormente ocupada por José Murilo de Carvalho, falecido em agosto de 2023.