Durante seu discurso de despedida, Toffoli elogiou Aras e afirmou que o “silêncio” do ex-PGR durante sua gestão foi fundamental para evitar uma ruptura institucional no Brasil. Toffoli não especificou os motivos dessa suposta ameaça de ruptura, quando ocorreu e quem estaria envolvido, mas insinuou que tudo seria revelado “mais à frente da história”.
A atuação de Aras em benefício de políticos e membros do Judiciário está documentada em diversos processos que tramitaram no STF e no STJ. Alguns desses documentos foram assinados pelo próprio Aras, enquanto outros foram assinados pela subprocuradora Lindôra Araújo, braço direito do ex-PGR em casos criminais.
Um caso emblemático é derivado da delação do ex-governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral. Aras e Toffoli atuaram juntos para arquivar os inquéritos relacionados a essa delação, mesmo após uma ordem do ministro Edson Fachin, também do STF, para que as investigações fossem realizadas. A delação mencionava, em seu início, ministros do TCU, como Bruno Dantas, e do STJ, como Humberto Martins, ambos negam as acusações de Cabral.
Após a homologação da delação em fevereiro de 2020, Fachin autorizou a abertura de vários inquéritos e encaminhou o caso a Toffoli, então presidente do STF. No entanto, Toffoli ignorou a decisão de Fachin, solicitou a manifestação de Aras e arquivou as investigações, algumas durante o recesso de julho e outras pouco antes de deixar a presidência da corte, em setembro de 2020.
Meses depois, novos depoimentos de Cabral mencionaram a participação de Toffoli em supostos esquemas de venda de sentença no TSE (Tribunal Superior Eleitoral). A PF solicitou a abertura de novos inquéritos, um deles contra o ministro do STF. Em resposta, Aras manifestou-se contra as investigações e reforçou sua posição contrária ao acordo com Cabral.
Com base nessa manifestação, Fachin proibiu a PF de investigar Toffoli e, posteriormente, o plenário do STF anulou o acordo de Cabral. Toffoli, na época, afirmou não ter conhecimento dos fatos mencionados e que nunca recebeu valores ilegais.
Outro político beneficiado pela atuação de Aras foi o presidente da Câmara, Arthur Lira. A PGR retirou a denúncia contra Lira em um caso relacionado a um suposto pagamento de R$ 1,6 milhão feito pela empreiteira Queiroz Galvão ao parlamentar. A denúncia foi oferecida pela PGR em junho de 2020, mas três meses depois a própria PGR pediu o arquivamento do caso, que foi aceito pelo STF.
Aras também mudou sua posição em relação a um ex-assessor de Lira que foi flagrado transportando R$ 106 mil em dinheiro vivo no aeroporto de Congonhas em 2012. Em 2019, o STF aceitou abrir uma ação penal contra Lira nesse caso, mas em 2020, Toffoli pediu mais tempo para análise, impedindo o andamento do processo. Em 2023, a PGR solicitou ao Supremo que rejeitasse a denúncia apresentada em 2018.
Recentemente, Aras novamente livrou Lira de investigações relacionadas a suspeitas de desvios em contratos de kit robótica. A PGR se manifestou contra a investigação conduzida pela PF e o caso foi barrado pelo ministro Gilmar Mendes, evitando o prosseguimento da apuração contra o presidente da Câmara.
Ciro Nogueira, presidente do PP, também foi beneficiado pela atuação de Aras. Em maio de 2022, Lindôra Araújo pediu o arquivamento de um inquérito que investigava a suspeita de que Nogueira recebeu propina da JBS em 2014. A manifestação de Lindôra foi contrária à investigação da PF, que afirmava que Nogueira cometeu os crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro. A defesa de Nogueira elogiou a manifestação da PGR.
Esses casos exemplificam a atuação de Aras em favor de políticos e membros do Judiciário, levantando questionamentos sobre a imparcialidade e independência do ex-procurador-geral da República durante sua gestão. As decisões tomadas por Aras levantam dúvidas sobre a verdadeira busca pela justiça e pelo combate à corrupção, pilares fundamentais do Ministério Público Federal.