
por Ana Trigo*
Em São Paulo, a eleição do novo prefeito está prestes a ser revelada. No entanto, o panorama político da cidade aponta para uma crescente influência de ideias religiosas e conservadoras, especialmente no que tange aos direitos das mulheres. Diante disso, peço desculpas aos leitores pela minha falta de otimismo em relação a esse tema.
O atual prefeito Ricardo Nunes (MDB) já deixou claro sua posição em relação ao aborto, ao suspender, sem explicações convincentes, o atendimento legal no Hospital Vila Nova Cachoeirinha e lançar a campanha “com Ricardo, aborto não” nas redes sociais. Em declarações públicas, Nunes reforçou sua postura pró-vida, fundamentada em convicções cristãs. Enquanto isso, o candidato Guilherme Boulos (Psol) defende o direito ao aborto legal para mulheres vítimas de violência sexual, embora tenha mantido um discurso evasivo durante a campanha.
No debate televisivo realizado em setembro, Boulos foi confrontado pela candidata Tabata Amaral (PSB) por abrir mão de posicionamentos históricos de seu partido, como a legalização do aborto. Nunes, por sua vez, optou por não comparecer a vários debates do segundo turno, deixando Boulos sozinho em frente aos jornalistas em algumas ocasiões.
Quando analisamos as propostas de saúde dos candidatos, nota-se uma superficialidade nas medidas direcionadas à saúde da mulher. Lígia Bahia, especialista da UFRJ, destacou que o plano de governo de Nunes foi limitado em relação à cobertura dos serviços de saúde para mulheres, enquanto Boulos nem mesmo mencionou essa questão em seu programa.
No Legislativo paulistano, as perspectivas para temas como o aborto legal são desafiadoras, considerando a eleição de vereadores com pautas conservadoras. Lucas Pavanato (PL), o vereador mais votado, já anunciou sua postura antiaborto e pró-vida, com apoio de figuras como Jair Bolsonaro. Essa tendência conservadora também se reflete na presença de Sonaira Fernandes, colega do mesmo partido com histórico de ações pró-vida.
Diante desse cenário, fica evidente a importância do debate e da reflexão sobre os rumos da política em São Paulo, especialmente no que diz respeito aos direitos das mulheres e a questões de saúde pública. É fundamental acompanharmos de perto as ações e decisões dos novos gestores e legisladores para garantir que a cidade avance em direção a uma sociedade mais justa e igualitária.
* Ana Trigo, jornalista, é mestra e doutora em Ciência da Religião pela PUC-SP. Pesquisadora acadêmica sobre a cracolândia desde 2013, é autora de diversos estudos e integra grupos de pesquisa focados em questões de gênero e religião.