
Ultimamente tenho desejado muito. Saber que uma criança amada foi diagnosticada com uma doença grave aos quatro anos mexeu bastante comigo. A partir desse momento, ou melhor dizendo nos últimos seis anos, tudo que fiz foi pedir pela cura.
Na minha casa, se você levantasse a escultura do Buda, encontraria o nome da criança. Aos pés da Nossa Senhora, estava a foto da criança. Sob o Daruma com um único olho pintado, lá estava a palavra “cura”. Até as minhas senhas eram palavras de fé. Isso é surpreendente, visto que até o aparecimento dessa doença, eu nem acreditava em Deus (e até hoje, às vezes, titubeio).
Para disfarçar um pouco a obsessão, no meu aniversário fingia que estava fazendo pedidos para mim quando apagava a vela, mas, na verdade, era pela criança que eu pedia. Nas viradas de ano, todas as ondas, uvas e moedas eram para ela. Até as lentilhas do dia 31 eram para a minha cura por ela, não pela minha fome.
Como mencionado anteriormente, eu não tinha fé. Mas fui aprendendo a ter. À força, na garra, na certeza de que muitas vezes só temos isso para nos agarrarmos. Lembro-me claramente do dia em que fui apresentada aos mistérios da vida. Já tínhamos visitado incontáveis médicos, e estávamos em um famoso, daqueles que você precisa implorar para conseguir um horário.
Ao final da consulta, preocupado com os exames que viu, o médico fez uma sugestão: caso tivéssemos fé em certas coisas, havia um médium em Mogi das Cruzes que poderia colaborar. Fiquei chocada. Se aquele homem da ciência, com seu jaleco ostentando a marca de um dos hospitais mais respeitados do Brasil, sugerisse isso, era porque a situação estava realmente complicada.
O médium não curou a nossa criança. Aliás, é importante ressaltar que nenhum tratamento deve ser substituído por terapias alternativas, uma vez que a interrupção de um tratamento médico pode custar uma vida. O que o médico recomendou foi continuar o tratamento e, adicionalmente, recorrer à fé, já que alguns de seus pacientes haviam se recuperado sem explicação.
Fomos a outros lugares além de Mogi. Nunca vou esquecer da experiência em um “hospital” onde nossa criança passou por um procedimento espiritual. Era como um hospital normal, mas iluminado com luzes vermelhas e verdes. Ao invés de instrumentos cirúrgicos, havia orações.
Todo mundo dizia para os acompanhantes fecharem os olhos e mentalizarem a cura, mas eu não conseguia. Só conseguia olhar para os lados, observar aquelas pessoas de branco com máscaras cirúrgicas rezando ao redor da maca, pensando no que escreveria a respeito daquilo.
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Não há nada mais triste do que ver uma criança enfrentando uma doença. A degeneração não deveria nunca, em hipótese alguma, habitar um corpo cuja maior vontade é brincar.
Há poucos meses, a nossa criança se curou. Não sabemos exatamente como, mas acreditamos que foi uma resposta tardia a uma intervenção médica, somada ao crescimento do órgão. Se a fé ajudou, nunca saberei, mas posso garantir que me trouxe algum alívio, o que não é pouco.
Nesta virada de ano, não pedi nada. Todas as ondas, as uvas e as moedas que jogarei em fontes serão para agradecer. Se você levantar o meu Buda, verá um adesivo escrito “obrigada”. E, ao lado, um Daruma com o segundo olho alegremente pintado.