
No debate de ontem, enquanto um adversário falava, Marçal se aproveitava da regra que mantinha sua imagem no ar para fazer micagens que desqualificavam o outro; para desenhar no ar, com os dedos, o seu número; para fazer com a mão a letra “M”… E não foi contido porque não se imaginou que, para desmoralizar um contendor, pudesse recorrer a uma diatribe não antevista nas vedações. Chamá-lo para um debate corresponde a propor que se jogue xadrez com um pombo. Ninguém vence a peleja em si. Mas só um pode arrulhar, derrubar as pedras e ainda fazer cocô na cabeça do oponente.
O IDIOTA DELIBERADO
Marçal já confessou, em bate-papo no podcast “Flow”, que age deliberadamente como um idiota porque, segundo diz, é isso o que quer o eleitor. E não tenho como chegar a outra conclusão que não esta: a cada vez que o jornalismo e os jornalistas põem a sua credibilidade para ouvir Marçal, seja em entrevistas, seja em sabatinas, procede-se a uma espécie de certificação, por mais crítica que seja, da idiotia.
Não estou aqui a sustentar que somos nós, da imprensa, a tornar viável a sua candidatura. Mas estou, sim, a dizer que essa viabilidade não poderia contar, de modo nenhum, com a nossa colaboração, ainda que vazada em tom crítico.
“Ah, Reinaldo, mas aí a imprensa deixaria de cumprir a sua função…”
Bem, queridos, estou a escrever um texto num tempo muito especial. Acredito que é chegada a hora de nós todos, diante daqueles que se organizam para destruir a democracia, repensarmos nosso papel. Trata-se, obviamente, de uma tese polêmica.
Penso num trecho de “O Homem Sem Qualidades”, espetacular romance de Robert Musil. Num dado momento de sua obra monumental — na qualidade e na quantidade — , há uma reflexão sobre o surgimento de uma “nova era”.