O Saneamento Básico no Brasil: Uma Cloaca Navegável
O saneamento básico é a cloaca na qual navegamos. Ou chafurdamos. Vergonha e ícone do nosso Brasil.
Também é o símbolo do nosso desrespeito à norma.
A lei 11445/07 define as regras nacionais para o saneamento básico. Ele contempla cinco funções: 1) abastecimento de água; 2) esgotamento sanitário; 3) limpeza urbana; 4) manejo dos resíduos sólidos; 5) drenagem e manejo das águas pluviais urbanas. É muito mais do que só água e esgoto como vulgarmente é conhecido.
Ignorar a lei, esporte nacional, é a alma mater de nossas desventuras. Tem mais.
Excluindo o serviço de água, que ganhou avanços reconhecidos, o restante é bastante frustrante. Os piores são o esgotamento sanitário e o manejo dos resíduos sólidos. Os lixões, os aterros sanitários, tudo o que já devia estar expurgado das cidades brasileiras, sobretudo, nas capitais e grandes cidades. Não estão e vão continuar pelo desrespeito à lei acima citada e por não haver punições aos infratores. Palavras importam mais do que ações.
Questão relevante é que não se pode colocar a culpa apenas nos gestores públicos de diversos matizes e partidos. Eles são sim responsáveis. Contudo, a população também. Tanto por elegê-los e reelegê-los, mesmo faltando com tais obrigações, como por não destinar o assunto, que é piso de civilidade, ao rol das demandas prioritárias. É como se fosse natural e não coubesse pronta ação.
Egoísmo privado: “Se tenho, dane-se o resto”.
Alimentação e saneamento básico compõem piso inegociável de dignidade humana.
Outra balela que se tornou estribilho é a afirmação de que obras enterradas não são realizadas por “não darem voto”, por não aparecerem. Dão votos sim, se forem cobradas pela população, e efetivamente realizadas. Quem oferta valor a ter água, esgoto e limpeza urbana? Todos. “Não dar voto” é papo de jacaré.
Precisa alguma tecnologia não existente no Brasil para efetuar o saneamento básico? Não. Falta dinheiro? Não.
Vê-se o dinheiro ser desperdiçado em milhares de obras inconclusas. Falta vergonha.
São Paulo, capital, tendo investido quase R$ 40 bilhões nos últimos três anos, pode ter cerca de 600 mil pessoas sem esgoto, segundo a Sabesp? Não. Pode ter o tratamento aos resíduos como é? Não.
Papo que saneamento básico é só tarefa do ente estadual é outro papo de jacaré. Por que não pode haver aporte da prefeitura e esforço conjunto? A “joia da coroa” da Sabesp é o município paulistano?
Porém, prevalece o “deixa que eu deixo” geral, o “não é comigo”, vexaminoso.
O controle do serviço de saneamento básico deve restar com a área pública, por ser estratégico e essencial. A iniciativa privada pode ser parceira em serviços específicos operacionais, onde o lucro represente lucro também para a população. Por exemplo, atuar no desperdício de água, muito grande, que em certas regiões, como o Nordeste chega a 50%. Pobreza arremessando riqueza fora. Cada percentual não desperdiçado seria remunerado à iniciativa privada com parte da economia gerada. O desperdício, inclusive em São Paulo, é muito grande.
Levantamento do UOL indica que a média anual de perda de água entre 2014 e 2019 foi de 823 bilhões de litros d’água, o suficiente para abastecer a capital paulista por um ano, que no mesmo período consumiu, em média, 685 bilhões de litros. Há outros serviços em que a iniciativa privada tornar-se-ia bem-vinda, trazendo sua eficiência, voltada para o lucro, em ganhos para toda a população.
“É impossível que ocorram grandes transformações positivas no destino da humanidade se não houver mudança na estrutura básica do modo de pensar”, disse John Stuart Mill, filósofo e economista britânico.
O que precisa mudar é a nossa cabeça. A mentalidade de nossa sociedade. Culpar o outro é exercício preferido do brasileiro —é doce, mas causa diabetes nas políticas públicas.
Precisamos de um projeto coletivo.
Mudar, inicia-se pelo básico, em nosso caso, pelo saneamento básico.