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Por Rodrigo Terra*
O ano de 2024 é um divisor de águas para a indústria de jogos eletrônicos no Brasil. Em março, com a sanção do Marco Legal dos Games (Lei Nº 14.852), o país passou a reconhecer a importância cultural, econômica e social dos jogos eletrônicos, ou, no popular, os videogames. A nova lei estabelece uma base sólida para o desenvolvimento, a produção e a comercialização destes produtos, em um ambiente de segurança jurídica. O cenário que se avizinha é estimulante: de acordo com o recente relatório da consultoria canadense Nordicity, intitulado “A Oportunidade de Ouro: Como o Brasil Pode se Tornar um Líder Global em Videogames”, o país poderá se tornar protagonista neste mercado.
O Marco Legal respondeu à necessidade de uma indústria crescente. Em 2015, o Brasil tinha cerca de 133 estúdios de desenvolvimento de jogos. Em 2023, chegamos a 1.042 estúdios. Este crescimento reflete a resiliência e a capacidade de adaptação da indústria brasileira de videogames, que, apesar dos desafios, continua a se expandir e se consolidar. Para contextualizar esse crescimento, podemos comparar o Brasil com o Canadá e o Reino Unido. Em 2015, o Canadá tinha 472 estúdios, enquanto o Reino Unido contava com 1.902. Em 2023, o Canadá superou 750 estúdios e o Reino Unido chegou a 2.740, se consolidando globalmente como grandes centros de produção e serviços.
O sucesso das políticas públicas nesses países oferece lições valiosas. O Canadá, por exemplo, implementou programas robustos de incentivos fiscais e apoio governamental. Transformando Vancouver e Montreal em hubs globais de desenvolvimento de jogos. O Reino Unido, com seu Vídeo Games Tax Relief (VGTR), oferece deduções fiscais significativas para empresas que desenvolvem jogos culturalmente britânicos há mais de 10 anos.
A Pesquisa Nacional da Indústria de Games 2023, conduzida pela Abragames, traz insights valiosos. Os dados mostram que o mercado brasileiro é predominantemente composto por micro e pequenas empresas, com 75% dos estúdios tendo menos de 10 funcionários. Esse perfil empresarial destaca a flexibilidade e a criatividade inerentes às pequenas equipes, mas também aponta para desafios importantes, como a necessidade de financiamento e acesso a mercados internacionais. A receita gerada pelas desenvolvedoras brasileiras, embora significativa, representa apenas 10% do consumo interno de videogames, indicando um grande potencial de crescimento.
É neste contexto de crescimento e desafios que o Marco Legal dos Games se torna essencial para a indústria de jogos eletrônicos. Ele regula fabricação, importação, comercialização, desenvolvimento e uso comercial de jogos eletrônicos. Essas atividades passam a ser livres, desde que respeitem a Constituição Federal e a legislação vigente. A definição ampla do que constitui um jogo eletrônico, incluindo desde obras audiovisuais interativas até aplicativos de celular e realidade virtual, reflete a diversidade do mercado e diferencia o videogame de outras modalidades de jogos, como os de apostas ou azar.
A indústria global de jogos eletrônicos movimentou cerca de US$ 159,3 bilhões em 2020, com projeções de crescimento contínuo. No Brasil, o mercado de jogos gerou aproximadamente R$ 7 bilhões em receitas naquele ano, posicionando o país como o 13º maior mercado de games do mundo. Com uma base de talentos significativa e um mercado consumidor vasto (74% da população brasileira joga, segundo a Pesquisa Game Brasil 2024), o país tem os ingredientes necessários para impulsionar sua indústria a novos patamares.
No mês passado, a Gamescom Latam mostrou o potencial do setor: foram mais de 101 mil visitantes e 12 mil reuniões de negócios entre 1.017 empresas, gerando um volume de negócios estimado em US$ 200 milhões.
Entretanto, os desafios são consideráveis. Um dos principais obstáculos é a necessidade de investimentos contínuos em infraestrutura e formação de recursos humanos. A Lei Nº 14.852 visa mitigar esses desafios, ao incentivar a criação de cursos e oficinas profissionalizantes focados no desenvolvimento de games.
A importação de equipamentos e softwares para o desenvolvimento dos jogos eletrônicos também é uma questão crítica. A lei prevê a regulamentação do desembaraço aduaneiro e das taxas de importação, mas a eficácia dessas medidas dependerá de um compromisso contínuo do governo em facilitar o acesso a tecnologias de ponta.
Para o Brasil alcançar os níveis esperados de sucesso, é decisivo que o governo implemente de forma eficaz os incentivos propostos e continue a investir em infraestrutura e educação. A criação de zonas de desenvolvimento tecnológico e as parcerias com instituições de ensino podem catalisar esse crescimento.
O Marco Legal traz um avanço significativo para a indústria de videogames no Brasil, criando um ambiente regulatório favorável ao crescimento e à inovação. Com a regulamentação célere de seus artigos, o Brasil terá o potencial de se tornar um líder global nessa indústria. Videogame é um jogo que não permite apostas: todos ganham.
* Rodrigo Terra é empresário, presidente da Abragames, fundador e membro consultor na XRBR – Hub de Empresas X-Reality, Membro da ATAS/Emmy – EUA e docente na pós-graduação ESPM.
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