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O investimento no casamento: entre o amor e o medo da solidão, como lidar com as relações a longo prazo



Investindo no amor: uma reflexão sobre casamento e felicidade

Investindo no amor: uma reflexão sobre casamento e felicidade

Ultimamente tenho observado um comportamento comum a alguns amigos casados: tratam suas relações como uma espécie de poupança ou investimento de longo prazo. Um CDBzão do matrimônio. Nada de errado em investir no amor. Pelo contrário, talvez essa seja a melhor forma de investimento disponível, já que o dinheiro pode até tornar a vida mais gostosinha mas não lhe dá sentido, muito menos faíscas da sempre tão fugidia felicidade.

O problema é que esses meus amigos estão investindo no casamento e não necessariamente no amor. E, por incrível que pareça, há uma diferença grande entre essas duas coisinhas tão comumente irmanadas ou até tomadas como equivalentes.

Tenho um amigo que não aguenta mais a mulher. A relação é tão desgastante que cada um tem uma vida paralela e, mesmo no pouco tempo em que convivem, só ficam se bicando. Segundo ele, não se separam porque já estão juntos há quase vinte anos e, apesar de tudo, ele sabe que pode contar com ela. Tenho uma colega de trabalho frustrada porque seu marido não quer mais transar há anos. Por que não se separa?, perguntei. Já tô com cinquenta e seis, vai que não encontro mais alguém tão bacana.

O que jaz no fundo dessas e de tantas outras relações? O pavor de ficar sozinho. Ou ainda: de envelhecer sozinho. Sentimento que se aguça na nossa faixa de idade. É compreensível, eu também sinto. Um medo de ficar mendigando a companhia dos filhos. Um medo de passar os domingos solitária, bebendo e ouvindo flashbacks. Um medo de não ter quem me acompanhe num exame de endoscopia. De passar o fim da vida sozinha numa casa de repouso.

Sentimos isso porque vivemos em um mundo que foi formatado para a vida a dois. Como nos lembra Brigitte Vasallo: “Existem poucos exemplos de vidas em comum fora desse formato. Nem a arquitetura está preparada para isso, uma vez que as casas e os apartamentos são projetados com um quarto de casal e quartos individuais para os filhos. Os carros têm dois assentos na frente (papai e mamãe), e as motos dois assentos (você e sua namorada). E assim até o infinito”.

É preciso coragem para sair desse modelo fechado na vida nuclear do casal. Somos ensinados que o mundo lá fora é inóspito: que bobagem. E não somos ensinados a considerar outras opções, como as relações não monogâmicas ou a vida sozinho.

É por isso que pensadoras como Vasallo, bell hooks e tantas outras, sugerem que se formem novas redes de afeto, fortalecendo amizades, criando comunidades de amigos, reavivando aquela aldeia que não cuida só de uma criança: também pode cuidar de nós quando estivermos velhinhos, ou em qualquer outro momento da vida.

Assim podemos até encarar o casamento como um investimento, mas de risco (como tudo na vida), e com rendimentos garantidos no presente. O que está ótimo. Afinal, o presente é a única coisa que realmente temos. Todo o resto, meus caros investidores, é mera especulação.

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