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Em sua primeira exibição em 1797, a obra de Luigi Cherubini recria a tragédia de Eurípedes, inspirada no mito de Medeia, uma mulher que mata os próprios filhos para vingar a traição do marido. A soprano Maria Callas foi tão grandiosa em sua interpretação que sua história ficou marcada na ópera. Este mês, ela completaria cem anos mas seu legado permanece forte.
Callas era conhecida como La Divina e teve sua imagem estampada em revistas e falada em programas de rádio, mesmo para aqueles que não frequentavam óperas. Seu talento para encarnar personagens díspares era evidente. O diretor cênico André Heller Lopes lembra da influência de Callas nos anos 1950, década em que a mídia e a indústria da propaganda se consolidaram. A soprano foi o centro das atenções, uma maneira de trazer esperança para a sociedade do século 20. Além de seu talento vocal, Callas deixou uma marca profunda com seu sentido teatral.
Contudo, a carreira de Callas foi marcada por dificuldades. Ela foi explorada por seu empresário, Giovanni Meneghini, e acabou se envolvendo num triângulo amoroso com o bilionário Aristóteles Onassis. Esse relacionamento afetou sua carreira e Callas acabou entrando em depressão, perdendo a voz e morrendo de uma parada cardíaca em 1977.
Mas, apesar das dificuldades que enfrentou, Callas revolucionou a ópera com Luchino Visconti, com quem montou a ópera “La Vestale” em 1954 no La Scala. Ela resgatou o repertório do bel canto e trouxe um novo sentido teatral às apresentações de ópera. Sua influência é sentida até hoje.
O tributo a Maria Callas em cartaz no Theatro Municipal de São Paulo é um exemplo do seu legado duradouro. As sopranos presentes no tributo interpretam seu repertório consagrado, mantendo viva a memória de Maria Callas. Ao século 21, a imagem mitificada da soprano ganha interpretações políticas. O debate se inflamou, há dois anos, com o lançamento da biografia “Cast a Diva —The Hidden Life of Maria Callas”. A autora irlandesa Lindsy Spence trata a artista como um símbolo feminista e revela, a partir de sua correspondência epistolar, que Onassis dopava a mulher e a abusava sexualmente. Houve muitas dificuldades ao longo de sua carreira, mas a legacia de Callas permanece forte até hoje. Ela foi verdadeiramente um ícone da ópera.