A entrevista com Paul McCartney no “Conversa com Bial”
A equipe do programa “Conversa com Bial” (Globo) merece todos os elogios. Fez uma extensa pesquisa sobre todas as nove vezes anteriores em que Paul McCartney veio ao Brasil. Desencavou momentos históricos e outros nem tanto, mas que valem pela curiosidade. Um trabalho do mais alto nível profissional.
Essas imagens então serviram de base para diversas perguntas ao ex-Beatle, que deu uma entrevista por videoconferência a Pedro Bial diretamente do México, última parada de sua turnê mundial antes de aportar em nosso país.
Simpático, chamando o apresentador de “Pedro” e aparentando um ligeiro cansaço –ou seria apenas o peso dos 81 anos de idade? –McCartney não fugiu de nenhuma questão. Tampouco conseguiu dar uma resposta reveladora a qualquer uma delas.
“O que faz você saber que está no Brasil quando acorda num hotel brasileiro?”. “Por que os Beatles nunca fizeram um show por aqui?”. “De quais bandas e músicos brasileiros você mais gosta?”. Diplomaticamente, Paul McCartney disse que assistiu a um show de um brasileiro em Nova York alguns anos atrás e que adorou. Pena, mas não se lembra do nome do cara.
Talvez esta até seja uma resposta pronta que ele usa quando alguém, de qualquer país, lhe faz uma pergunta parecida. O fato é que o “Conversa com Bial” exibido na madrugada deste sábado (2) fez tudo o que podia para ressaltar a ligação do ex-Beatle com o Brasil. E ficou claro que, na melhor das hipóteses ela é tênue.
Paul McCartney não está particularmente interessado na nossa cultura. Não sente que sua alma canta quando vê o Rio de Janeiro pela janelinha do avião. Nem parecia se lembrar de Lizzie Bravo, a brasileira que acampou na porta dos estúdios Abbey Road e acabou sendo chamada para fazer “backing vocals” na canção “Across the Universe”.
Não que ele não goste do Brasil, pelo contrário. Adora o carinho do público e as centenas de milhares de fãs que vibram a cada nova excursão sua. Mas não nutre nenhuma preferência especial pelo nosso borogodó, e temos que lidar com isso.
Sua primeira visita a estas plagas foi em 1990, quando o país já estava há quase uma década na rota dos grandes shows internacionais. Lotou todos os estádios em que se apresentou e voltou sempre que pôde, a cada vez incluindo mais cidades em seus roteiros.
Seu talento é indiscutível. Paul McCartney é um dos gigantes da música de todos os tempos, de qualquer gênero, e tê-lo tantas vezes por aqui é um privilégio. Mas o “Conversa com Bial” talvez tenha perdido a oportunidade de fazer uma entrevista menos morna se não insistisse tanto no suposto amor de Paul por terras brasileiras.
O programa cresceu de interesse quando mudou o assunto para “Now and Then”, a derradeira canção dos Beatles, lançada um mês atrás. Pedro Bial arriscou dois debates pertinentes: a faixa pode mesmo ser creditada ao quarteto como um todo? E qual o papel que a inteligência artificial teve no processo? É mesmo a voz de John Lennon que estamos ouvindo, ou a de um robô programado para imitá-lo?
“Now and Then” não é o único lançamento de Paul McCartney este ano. Ele toca baixo em “Bite My Head Off”, uma das faixas mais animadas de “Hackney Diamonds”, o novo álbum de inéditas dos Rolling Stones. Foi McCartney, inclusive que sugeriu a Mick Jagger o nome de Andrew Watt para produzir o disco. Como fã, eu adoraria saber de mais detalhes desse encontro dos antigos supostos rivais, mas o assunto nem veio à baila.
Enfim, mito é mito, e a essa altura da vida, talvez Paul McCartney não tenha mesmo mais nenhuma novidade bombástica a nos contar. Ele sempre foi muito aberto, muito atento à imprensa, e sua vida pessoal pouco movimentada nunca alimentou os sites de fofocas. Trata-se de uma entidade, e devemos venerá-lo como tal.
Mas que a entrevista a Pedro Bial foi morna, ah, isto foi.