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Brasil tem a oportunidade de se destacar no enfrentamento da crise do aquecimento global, mas será capaz de aproveitá-la?

Stefan Zweig – O Brasil e a Crise do Aquecimento Global

Stefan Zweig é um dos escritores mais admirados do Brasil. Sua obra transcende a análise meramente literária e nos conquista de forma afetiva. Talvez porque aprendemos com Zweig que a Marselhesa foi composta em uma única noite, em Estrasburgo, não em Marselha. Ou talvez porque nos fascinamos com suas biografias e sua envolvente autobiografia, “O mundo que eu vi”. Mas é principalmente pelo sentimento de admiração e compaixão pelo brilhante homem, que não resistiu aos reveses da vida e acabou cometendo suicídio no Brasil em 1942.

Antes de sua morte, Zweig escreveu “Brasil, país do futuro”, livro que ultimamente é mais lembrado por seu título do que por seu conteúdo. Durante várias décadas, acreditou-se que o Brasil estava prestes a se tornar uma grande potência, mas a estagnação econômica desde os anos 1980 fez com que a piada “o Brasil é o país do futuro… e sempre será” se tornasse uma realidade triste.

No entanto, agora, o Brasil tem uma nova oportunidade de mostrar seu potencial. Com a crise do aquecimento global, o país pode se destacar em um cenário que exige que todas as nações zerem suas emissões de carbono até 2050. Estudos indicam que o Brasil pode ser a primeira nação do G20 a atingir essa meta.

O Brasil tem algumas vantagens a seu favor. Nossa matriz energética é uma das mais “limpas” do mundo, temos um território e uma insolação privilegiados, além de anos de desenvolvimento tecnológico que nos dão uma vantagem competitiva na produção de hidrogênio verde e biocombustíveis.

Além disso, quase metade das nossas emissões vêm do desmatamento, que pode ser evitado, e temos um enorme potencial de absorção de carbono em nossas florestas e áreas degradadas.

No entanto, seria um grave erro acreditar que o Brasil pode realizar todo esse potencial de forma isolada. Será necessário integrar-se a uma cadeia global que regule as trocas entre os países e estabeleça compromissos de redução de emissões. As regras dessa cadeia global estão sendo negociadas diariamente entre os grandes países em fóruns internacionais.

Infelizmente, o governo anterior excluiu o Brasil desse jogo. Mas agora, com um discurso ambientalmente responsável, temos a oportunidade de recuperar nossa influência e almejar um lugar de força nas negociações.

No entanto, para isso, medidas concretas precisam ser tomadas. A principal delas é a contenção do desmatamento na Amazônia. Embora já tenhamos boas notícias nessa frente, ainda há muito a ser feito para que a preservação da floresta seja sustentável.

Será fundamental também dar à proteção ambiental no Brasil o status de “questão de Estado”, para que não esteja sujeita a mudanças de rumo a cada nova eleição.

Uma vez que recuperarmos nossa influência nas negociações, poderemos reivindicar várias questões, desde a responsabilização dos países emissores até o estabelecimento de um preço global para o carbono. Devemos também adotar métricas que reconheçam as capacidades únicas da agricultura tropical em capturar carbono e valorizar a biodiversidade.

Em relação à postura que devemos adotar nas negociações, acredito que a linha europeia seja a mais conveniente para o Brasil. Se nos aliarmos a países que valorizam a captura de carbono e estabelecem regras rígidas, poderemos aproveitar nossas vantagens comparativas e nos destacar no cenário global.

Entretanto, é importante mantermos uma política coerente. Ignorar as recomendações do Ibama e explorar petróleo na margem equatorial seria um custo diplomático alto demais para os benefícios duvidosos que essa medida traria.

O mundo está em um ponto de inflexão em relação ao petróleo. Investir nessa indústria em declínio seria um erro que nos manteria presos à imagem de “país do futuro”. Devemos aproveitar a oportunidade de liderar no ciclo econômico de baixo carbono.

A coluna acima já estava escrita quando fatos mais graves fizeram-me pensar em substituí-la por esta nota (“Indignação, e ponto”). Agradeço à Folha por permitir a publicação de ambos os textos.


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