
Desde 1984, em Los Angeles, o Brasil tem marcado presença nas Olimpíadas, levando mais de 150 atletas a cada edição. A partir de Atlanta-1996, esse número aumentou para mais de 200.
Em Paris, a delegação brasileira conta com 276 atletas. O desafio não está apenas nas 15, 20 ou 25 medalhas conquistadas. O verdadeiro dilema é que, durante os 18 dias de competição, temos que lidar constantemente com a derrota. E, na verdade, não gostamos muito de perder, nem somos tão entusiastas do esporte. O que realmente nos interessa são as medalhas.
Possuímos a síndrome de Mutley, o cachorro ajudante de Dick Vigarista. Tudo o que almejamos é “medalha, medalha, medalha”; de preferência, de ouro.
Sempre que um atleta como Arthur Zanetti conquista o ouro nas argolas, de repente, todo mundo se sente um expert em movimentos como o cristo invertido. Até o twist carpado se torna febre em padarias e elevadores.
Nas décadas de 1980, era bem diferente. Lembro-me de como era raro alcançar uma única medalha de ouro. Quem conquistava era celebrado como um campeão de uma Copa do Mundo de futebol.
Em Sydney-2000, após os Jogos, ficou um gosto amargo. A delegação brasileira recebia pratas, bronzes, todos comemorados, porém o ouro não chegava.
Uma comoção tomava conta. Diariamente, todos na Vila Olímpica procuravam o “coitado” que teria a obrigação de conquistar o ouro.
Todas as vitórias e derrotas, esperadas ou inesperadas, recaíam sobre o cavalo Baloubet du Rouet, que não suportou a pressão e falhou na prova de saltos, montado por Rodrigo Pessoa. Se Baloubet du Rouet tivesse Twitter, seria cancelado.
Nas Olimpíadas mais recentes, a busca pelo ouro mudou. O acesso a recursos esportivos aumentou, mas nem sempre é aproveitado da melhor maneira.
Atualmente, uma medalha de ouro não é mais suficiente. Todos querem mais, é como uma bola de neve.
Dirigentes prometem mais recursos para alcançar mais conquistas, atletas com desempenho em mundiais pretendem lutar pelo pódio, e na TV, quase colocam a medalha no pescoço do competidor antes mesmo da prova começar.
“Vamos torcer juntos pela medalha. Quem sabe até conquistamos um ouro?”, disse um narrador antes da final da canoagem C2 500 m, na qual o Brasil terminou em oitavo entre oito competidores, mas não pode ser considerado o último.
E se ele tivesse mencionado que chegar à final já era uma grande conquista? Que alcançar o pódio era extremamente difícil, considerando que seis competidores tinham tempos melhores? O ufanismo olímpico é o que nos prejudica. Pelo menos na Copa, sofremos uma única derrota.
Este escriba, que costuma ver o copo meio cheio durante os Jogos Olímpicos, acreditava que se bateria o recorde de médalhas, de ouros e de modalidades com pódio. Ingênuo.
Precisamos reduzir nossas expectativas e eleger alguns adversários olímpicos equivalentes. A Argentina pode ser um bom rival no futebol, mas nas Olimpíadas, nem começa a competir conosco.
Sugiro a Nova Zelândia, país de clima quente, com muitas áreas de mar, do tamanho aproximado de Tocantins e uma boa diversidade de modalidades olímpicas.
Em Tóquio, com 213 atletas, a Nova Zelândia conquistou 7 medalhas de ouro, 6 de prata e 7 de bronze — ficamos atrás por apenas um bronze. Uhu. No Rio, o Brasil conquistou 19 medalhas, sendo 7 de ouro. Eles alcançaram 18 medalhas no total, com 4 de ouro. Uhu.
Em Paris, os “danados” já conquistaram 13 medalhas, com 5 de ouro. Temos 15 (até o momento desta coluna), mas apenas 2 de ouro. Dificilmente conseguiremos ultrapassá-los. Pontos para os neozelandeses.
No entanto, nos encontraremos novamente em Los Angeles, em 2028. O foco deve ser nesse confronto. Já consigo imaginar Galvão Bueno, em alguma transmissão, mencionando que vencer é bom, mas vencer a Nova Zelândia é ainda melhor.
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