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Elon Musk: biógrafo revela o perfil do empreendedor excêntrico e controverso que decide o destino de nações

Em uma noite de 2022, ocorreu uma tentativa frustrada das Forças Armadas da Ucrânia de explodir a frota naval russa baseada em Sebastopol, na Crimeia. Surpreendentemente, durante essa operação, a Starlink, subsidiária de internet da SpaceX, empresa de exploração espacial liderada por Elon Musk, foi utilizada para guiar os drones submarinos até seus alvos. Desde o início da guerra, Musk vinha fornecendo infraestrutura de rede para a comunicação ucraniana como forma de contornar a sabotagem do invasor.

No entanto, ao tomar conhecimento da ofensiva, Musk tomou uma decisão estratégica de ordem militar: desativar os satélites da Starlink, tornando o ataque inviável. Ele temia que a explosão dos drones submarinos levasse a uma escalada do conflito. Embora sua atitude possa ter sido correta, a pergunta que surge é: quem é Elon Musk para tomar esse tipo de decisão em um conflito de tamanha magnitude?

Essa é a questão central abordada no novo livro de Walter Isaacson, renomado biógrafo, que será lançado mundialmente na próxima terça-feira. Com mais de 600 páginas, a obra revela um retrato de Musk como um anarcocapitalista hipercompetitivo, um pai fisicamente presente, mas emocionalmente ausente para seus dez filhos – inclusive uma transexual comunista que renega seu sobrenome. Isaacson retrata Musk como um workaholic messiânico, com dificuldade em demonstrar empatia e que desenvolveu uma aura de ser extraterrestre, como se sua missão de colonizar Marte fosse uma tentativa de retornar a seu verdadeiro lar.

Isaacson, ex-chefe da CNN e da revista Time, é um jornalista e historiador com ampla experiência nas esferas de poder nos Estados Unidos, tendo convivido com figuras como Gates, Jobs, Musks e Kissingers. Sua habilidade como jornalista é evidente em seu fluente texto e precisão na apuração dos fatos, porém sua abordagem histórica é limitada. Em seu livro, por exemplo, ele não explora a infância de Musk na África do Sul durante os turbulentos anos do apartheid, parecendo ignorar completamente a existência da população negra. Apenas três vozes negras são mencionadas ao longo da obra: as de Kanye West e Azealia Banks, retratados como insanos, e a de Barack Obama, considerado um personagem institucional.

Vozes femininas também são pouco representativas na obra, muitas vezes aparecendo como meros termômetros das oscilações do bilionário. No entanto, é importante ressaltar que esse é o universo em que Musk vive.

Apesar dessas limitações, fica claro que desde o início de sua carreira, Musk busca avançar a “humanidade”. De acordo com um funcionário da SpaceX, Lucas Hughes, “Elon se importa com a humanidade de uma forma muito mais ampla”. No entanto, esse cuidado se mostra muitas vezes abstrato diante de sua falta de embasamento filosófico. Durante sua juventude, Musk leu obras de existencialistas, mas diante do pessimismo de Nietzsche e Heidegger, ele parece ter encontrado em “O Guia do Mochileiro das Galáxias” sua visão utópica.

Fisicamente, Musk parece desprendido de qualquer localidade específica, transitando entre as linhas de produção da Tesla e exigindo cortes de gastos diretamente dos operários. Não há referências à paisagem ou geografia, apenas uma sociedade de caráter thatcheriano, em que indivíduos se reúnem por ambições retratadas como grandes aspirações humanistas, mas que na verdade são permeadas pela competitividade infantil e piadas de cunho sexual.

Contradições surgem no âmbito pessoal, frequentemente acompanhadas de explosões verbais por parte do protagonista. Em alguns momentos, essas contradições se transformam em uma batalha entre o Musk arrojado, considerado um ícone pop, e a burocracia e elite empresarial. No entanto, Musk sempre parece sair desses confrontos com uma aura de irresponsabilidade cool, o que acaba por transformá-lo em um anti-herói em sua vida privada, necessário para complementar seu status de herói na esfera pública.

A principal característica desse “heroísmo” público é o ímpeto colonizador de Musk, sua ambição de estabelecer uma nova civilização em Marte e tornar o ser humano uma espécie multiplanetária. Porém, como contrapartida, ele parece ignorar a sobrevivência da Terra, mitigando esse problema por meio de esforços na transição energética. No entanto, sua incapacidade de pensar em soluções coletivas é evidente devido à falta de consideração com a sociedade, tornando o carro de luxo o pivô de sua revolução.

O estilo do texto, rápido e direto, se aproxima de uma narração esportiva, o que permite que parâmetros técnicos sejam apresentados de forma emocionante, como se fosse um thriller. Além disso, facilita a compreensão dos métodos de um empresário que, em uma era de financeirização e desindustrialização, prospera por meio da produção. Se essa narrativa inspirar outras pessoas a valorizar o produto mais do que a evasão fiscal, então já terá valido a pena.

No entanto, é importante ressaltar que Musk não é um super-homem, mas um capitalista esperto e megalomaníaco, sem nenhum pudor em esmagar qualquer pessoa que esteja em seu caminho para alcançar o sucesso. Isaacson aceita a sociopatia de seu biografado rico, mas não a considera trivial. Ele insiste em retratá-lo como um gênio arquetípico de uma cultura self-made, ao mesmo tempo que atribui a ele o status de único provedor da cura milagrosa para o apocalipse.

Em suma, o livro de Walter Isaacson oferece um retrato intrigante de Elon Musk, um personagem complexo e controverso. Embora sua abordagem histórica seja limitada, sua habilidade como jornalista e historiador é inegável. Resta ao leitor ponderar sobre as ações e decisões de Musk, bem como sobre as consequências de seu imenso poder e influência.

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