Descontentamento em Hong Kong aumenta a vontade de emigrar: população vota com os pés diante das restrições do regime autoritário.






Jornal – Notícia Internacional

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“Na China, as pessoas votam com os pés”. Enquanto vivi em Pequim, ouvi essa frase dezenas de vezes, ora em tom jocoso, ora com ares de decepção. O significado implícito é que, na falta de uma democracia representativa liberal, os descrentes ou desgostosos com o sistema político seguem a máxima “os incomodados que se retirem”. Mudam-se para outros países.

Este não costumava ser exatamente o caso de Hong Kong, a região administrativa especial cujo controle foi devolvido aos chineses em 1997 sob a promessa da manutenção de um sistema com mais liberdades individuais e coletivas. Protegidos pelo princípio de “um país, dois sistemas”, honcongueses desfrutavam, por exemplo, de liberdade de imprensa, internet livre e voto direto para certos cargos do Legislativo. Direitos que começaram a ruir pós-manifestações de 2019 e a consequente lei de segurança nacional implementada para lidar com os motins.

O resultado de uma política cada vez mais próxima da adotada no território continental pode ser visto em números. Pesquisa divulgada pela Universidade Chinesa de Hong Kong —uma das mais importantes da região especial— mostrou que 38% dos residentes dizem que deixariam a cidade se tivessem a oportunidade.

É o retrato vivo de um tiro que saiu pela culatra. Os manifestantes primeiro foram às ruas em 2014 protestando contra a decisão de Pequim de chancelar ou indicar diretamente os candidatos às cadeiras do Conselho Legislativo local e depois para impedir a aprovação de uma lei de extradição para a China continental, cujo sistema judiciário punitivista e opaco é conhecido pela ingerência governamental.

Mesmo quem tentou a sorte nas urnas precisou passar por crivo à prova de separatistas e ativistas pró-democracia. Todos foram submetidos a cuidadoso escrutínio antes de terem suas candidaturas validadas. Uma vez selecionados, juravam lealdade à China, reconhecendo a soberania do Partido Comunista em Pequim.

Na semana passada, por exemplo, um dos ícones remanescentes da efervescência política em Hong Kong, a jovem parlamentar Agnes Chow, decidiu violar os termos da liberdade e fugiu para o Canadá. Votou com o pé, à exemplo do ditado popular. A cidade prometeu que ela viveria como fugitiva pelo resto da vida e jamais poderia voltar para casa. Talvez tenham falhado em entender que, para muitos cidadãos locais, o conceito de casa talvez deixou de existir há alguns anos.


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