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No Equador, o dilema do correísmo e a vitória da Pachamama em Yasuni – desafios para o futuro do país.

Quanto a Luisa González, a candidata do correísmo dificilmente conseguirá novos aliados para o segundo turno. Esperar que Yaku Pérez a apoie no segundo turno seria algo compreensível, mas que não aconteceu durante a primeira semana após o primeiro turno. Ela terá que ser paciente. O apoio de Pérez é mais importante pelo significado simbólico do que numérico. A opção de endossar este voto supõe um ato de racionalidade política que parece estar ausente na conduta deste líder que, em algum momento, também propagou o discurso anticorreísta. O cenário não está nada fácil para Luisa González.

Yasuni, triunfo à parte

Valor de uso ou valor de troca? O dilema planteado pela Teoria do Valor (Marx) à nossa realidade centrada foi reproduzido, desta vez, na questão do Parque Nacional Yasuni, que abrange mais de um milhão de hectares.

No plebiscito sobre o permitir ou não a exploração de petróleo nessa zona, venceu a opção da defesa dos direitos da natureza. Também foi, sem dúvida, uma vitória das populações indígenas que vivem neste território megadiverso que faz parte do espaço amazônico, algumas delas em isolamento voluntário. Em 18 meses, contados a partir da data da votação, nem mais uma gota de petróleo poderá sair da região, por decisão do poder popular.

Por outro lado, Karl Kautsky ficaria feliz em ver como a renda fundiária na América Latina, em meados da terceira década do século XXI, tem expressões concretas e muito próprias. Marx já dizia que a evolução da sociedade não é linear (escravidão, feudalismo, capitalismo, comunismo), uma vez que os sistemas de organização do poder, de controle dos meios de produção, bem como as relações de produção derivadas, respondem a realidades concretas, tais como as sociedades que ocuparam o espaço andino, incluindo a civilização Inca.

O Equador tornou-se pioneiro na luta pela defesa da natureza. O referendo, mecanismo legítimo de expressão do poder do povo, estabeleceu que, acima de qualquer consideração mercantil, está o “valor de uso” da natureza, o seu caráter de “casa” de milhares de cidadãos que nela vivem e usufruem dos seus frutos. Quem quis transformar em mercadoria quebrou a cara. A sentença do povo equatoriano foi clara: nem tudo é mercadoria, nem tudo é dinheiro. Tardarão anos para que existam novas condições para permitir que o conceito de “valor de troca”, típico do sistema capitalista, volte a ser relevante no caso de Yasuni, para atender aos interesses do grande capital. Por enquanto, o extrativismo predatório não existe mais na região.

O povo equatoriano, depois de uma longa luta iniciada em 2006, acaba de demonstrar ao mundo inteiro que nem tudo é capitalismo selvagem, nem esse que se diz hipocritamente “civilizado”. Na nossa América Latina existem realidades, talvez pouco visíveis por enquanto, onde há uma visão de mundo que estabelece o respeito pela natureza como prioridade.

Para os capitalistas dedicados às mercadorias e ao “valor de troca”, essa decisão é quase uma loucura, dado que os equatorianos perderão milhares de milhões de dólares por ano como parte da “renda da terra”. Estes defensores da renda diferencial e absoluta da terra nunca compreenderão que o respeito pela natureza está acima da economia e do cálculo frio do lucro. Cerca de 59% das equatorianas e equatorianos preferiram o direito de ter um bom relacionamento com a Pachamama. A lógica do mercado foi derrotada.

Foi um voto de “SIM” à vida. Um “SIM” para o petróleo ficar onde está, no subsolo. Um “SIM” para os presidentes da Amazônia, após a cúpula em Belém do Pará, levarem muito em consideração.

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